quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O RPG

Role Playing Game - Jogo de Interpretação de Papéis - mais conhecido pela sigla RPG, consiste na união do conceito de teatro com as regras de um jogo, onde temos a interpretação de personagens ficcionais controlados pelo seu respectivo jogador.

No teatro, os atores decoram seu script - conjunto de ações, gestos, falas... - e interpretam personagens de ficção, seguindo o enredo pré-definido pelo autor. Em um jogo, as pessoas tomam decisões limitadas pelas regras, para ultrapassar desafios, ser melhor do que seus adversários e vencer o jogo. Quando se une o que há de melhor nesses dois universos, temos o RPG.

Cada jogador, é responsável pela criação de seu personagem, dos caminhos que ele trilhou até chegar ao momento em que o narrador, toma o fio da história e reúne numa mesma narrativa, os diferentes personagens, criados por diferentes pessoas...

Aqui vocês encontrarão, algumas das minhas personagens de RPG, como Elisah, a Ladra, as vampiras Shinny, Badr al Budur, o anjo Murarih, a jovem hunter Camila e outras, desenvolvidas para o universo fantástico do RPG.

Entre e beba dessa taça comigo.

A Ladra e o Mago - Cap.03

Antes que os dois sóis manchassem de laranja a madrugada fria, Lythande se vestia para partir, quando ouviu leves batidas à porta.


- Quem está aí?


- Elijah, companhero de viagem de Elisah.


Lythande abriu a porta e se deparou com um bonito adolescente de uns quinze anos, de cabelos vermelhos e grandes olhos azuis. O garoto ficou por uns instantes boquiaberto, fitando o rosto limpo e anguloso do Mago, a estrela de brilho frio entre as sobrancelhas.


-Eu...eu... a senhora Elisah o espera na saída norte. Podemos ir?


-Vamos...Elijah, não é?


O garoto sorriu ao ouvir a voz cheia do mago pronunciar seu nome.


-Sim, Elijah. Parece o de Elisah, não é?


Os dois se puseram a caminho da saída norte. O silêncio do Mago era contraposto à tagarelice inocente de Elijah, até que Lythande fitou seriamente seu interlocutor, um leve brilho em sua estrela e Elijah baixou a cabeça.


-Ah, me desculpe se estou incomodando o senhor...


Lythande balançou a cabeça. A voz do garoto era cristalina, melodiosa, mas o Mago estava habituado ao silêncio.


Elisah estava montada num cavalo pardo, a bolsa de flechas sobre o manto de peregrino, duas mochilas presas à garupa.


- Espero que tenhas tido um bom sono Lythande. tudo bem, Elijah?


- Tudo minha senhora, mas creio ter aborrecido o Mago com minha conversa.


Elisah sorriu e tocou o cavalo.


- Bom saber, Elijah não costuma falar com estranhos, se o fez, é porque gostou de ti, Mago.


Elisa cavalgava lentamente para não se distanciar, mas, às vezes disparava a galope, para esperá-los adiante. Lythande, condoeu-se do garoto e tentou entabular uma conversa com Elijah que parecia triste em seu silêncio.


-Por que ela não usa calças para cavalgar? Com o capuz sobre a cabeça, ao longe, todos julgariam ser um homem, seria mais seguro.


Elijah, ergueu os olhos brilhantes para o mago. Seu rosto denunciava a alegria que sentia ao ouvir o mago lhe dirigir a palavra.


-Elisah diz que se precisar renunciar ao que é por segurança, não merecerá nem ser mulher, nem ter segurança. Isso para ela é covardia ou admitir a própria fraqueza e um dos dois sóis  vai se apagar no dia em que ela demonstrar covardia ou fraqueza.


Lythande franziu o cenho, pensando em como seria prazeiroso, dobrar o orgulho daquela mulher.


Um dos dois sóis já tinha se posto, quando se aproximaram de um rio, onde Elisah decidiu passar a noite.

- Vamos ficar por aqui, Elijah precisa descansar. Garoto,  a pedra.

Ele pegou uma pedra e após observar as árvores, atirou-a na árvore de copa mais larga. Com isso vários pássaros levantaram vôo e Elisah derrubou dois deles com flechadas certeiras.

- Prepare a caça para nós Elijah, eu vou me banhar. Pegue o que for preciso em minha mochila.


Elisah então, caminhou em direção ao rio, desfazendo a trança e despindo seus trajes, inclusive
duas faixas de couro, que estavam presas às coxas, ficando apenas com a camisa branca que ia quase até os joelhos e mergulhou no rio. Lythande abaixou-se à margem do rio, sem acreditar em tamanha falta de pudor.


- Não te constrange banhar-se assim diante de nós?


-Se não estivesses aqui Mago, banharia-me nua. Se mantenho essa camisa, é em respeito a ti.


- E o garoto? Além de caminhar o dia todo, ainda tem que preparar tua refeição?


Elisa se aproximou do mago, os cabelos esparramados no espelho d'água.


- Elijah, precisa aprender que a vida é difícil. ele precisa ter noção de realidade e saber se cuidar. - a ladra encarando Lythande, pousou a mão pequena sobre seu joelho - Elijah gosta de você, Mago. Por que não o ensina a fazer magia? Elijah é inteligente, será um ótimo aprendiz.

- Quer se livrar do garoto?


- Quero livrá-lo de mim! Ou acha que desejo que um garoto esperto e cheio de vida como Elijah se torne um ladrão, um mercenário sem pouso? Ele merece mais.

Lythande encarou sarcástico o olhar intenso da ladra.


-Cuspindo no prato em que come?


- Que escolha eu tinha, Mago? Haviam dois caminhos para mim; tornar-me meretriz como minha mãe e deitar-me a cada noite com um bêbado diferente ou casar-me com um qualquer e a cada noite me deitar com o mesmo bêbado. Lythande, fosse qual fosse a minha escolha, estaria reduzindo minha alma a menos que um pano de chão. Sou uma águia, preciso voar, minhas asas não cabem em gaiolas, por mais douradas que sejam! Ainda assim, não desejo para Elijah, o que não desejo para os filhos que terei um dia.


Elisah saiu da água e começou a secar-se.


-A Grande Deusa espera que eu Lhe dê filhos; em Shariman conheci um homem com quem gostaria de tê-los, mesmo ele sendo um clérigo de Vékna...como eu gostaria de ter tido uma filha com Enemark e sagrá-la sacerdotisa...Mas eu tive medo e aguardei em vão um momento certo para dizer a ele que o desejava.- Elisah se envolveu no manto para vestir roupas secas protegida do olhar de Lythande -Quando ouvires a voz do amor, segue-a, adepto da Estrela. Eu me fiz surda e sofro só.

Vestida, Elisah foi ajudar Elijah e deixando Lythande sozinha.


Elijah assou a carne com sal e especiarias e a serviu com pão. Lythande por diversas vezes surpreendeu o olhar fixo do garoto que o observava.


- Não vais comer, Mago?


- Não Elijah.


- Por que não? Está em teus olhos que tens fome.


-Sirva Lythande Elijah e venha comigo, amarrar minha rede. O mago deve comer só.


Lythande encarou a ladra, ela percebera.


O garoto prontamente colocou pedaços das aves, pão e frutas secas em uma folha larga, entregou ao mago e se afastou com Elisah. Lythande sorriu levemente, protegido pelo manto. Elijah se esforçava tanto em agradá-lo, talvez pudesse realmente ser um bom aprendiz.

Ao vê-los desaparecerem na mata, Lythande tomou a direção do rio, para comer envolto pela escuridão. Quando Elijah retornou, Lythande já estava novamente ao lado do fogo, fumando preguiçosamente.

- Onde está Elisah?


- Dormindo no alto de uma árvore. A rede cor das folhas a torna invisível à noite...


- E tu não vais dormir?


- Não antes de ti, Lythande.


A estrela azul de Lythande reluziu suavemente diante do olhar puro e intenso do garoto.


- O que são aquelas faixas de couro que Elisah prende às coxas?


Elijah olhou em todas as direções antes de responder num sussurro:


- És bom em guardar segredos?


- Não imaginas o quanto.


- São lâminas envenenadas. É assim que morrem todos os homens que tentam violentá-la. Uma lâmina a protege da outra e ela não se corta.


Lythande sorriu balançando a cabeça, esperta a ladra. Olhando para Elijah, sentiu o quão cansado estava o garoto.


- Guardarei mais este segredo, Elijah. Agora vamos dormir.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A ladra e o Mago - Cap.02

Elisah subiu as escadas, desfazendo a longa trança e Lythande não se furtou a pensar em o quanto a segurança daquela mulher era irritante. Oras, ela era apenas uma mulher, com toda a fragilidade de seu sexo! Várias vezes ouvira falar de Elisah, a ladra de beleza selvagem e flechas certeiras. A desenvoltura e a ousadia dela eram acintosas, próprias de cortesãs e no entanto, dizia-se que era casta como uma menina e que todos que tentaram tomá-la pela força, morreram.

Lythande sorriu, pensando que não seria ela a tomar a ladra pela primeira vez, enquanto subia para o quarto, acompanhada por Vissek, que carregava uma bandeja com carne, pão, frutas secas e vinho.

Após a saída do taverneiro, Lythande certificou-se de que não havia frestas por onde pudesse ser observada, para em seguida despir o pesado manto, as adagas presas à cintura e por de lado as botas de peregrino. Era o instante de liberdade de Lythande, que comeu e bebeu prazeirosamente, para logo em seguida, enrolar algumas ervas secas e acendê-las na lareira, aspirando a fumaça relaxante.

Elisah... só mesmo com a fama de assassina da ladra para uma mulher ser respeitada em Gandrin. Na juventude de Lythande, já perdida na curva do tempo as coisas eram diferentes; nunca uma mulher sozinha seria tratada da maneira que Elisah era. Naquela época, restaria à ladra apenas o abrigo seguro de vestes masculinas, assim como a Lythande, único refúgio onde uma mulher poderia fugir de seu destino. Lythande sorriu maliciosa, envolta na fumaça, pensando em como Elisah ocultaria o corpo voluptuoso em vestes masculinas.

Lythande, aquela que renunciara ao universo feminino, para tornar-se um Mago Adepto da Estrela Azul, se ergueu e recitou pequeno feitiço, protegendo o quarto.

Afinal no aposento ao lado, havia uma ladra.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A Ladra e o Mago - Cap.01

Lythande ergueu o olhar para a entrada da taverna; Havia caminhado dois dias e duas noites até chegar a Gandrin. Não tinha planos de retornar tão cedo à grande cidade, mas não teve muita escolha...um rei lhe exigia um sortilégio e para este, precisava de algo um tanto difícil de obter; uma unha do Gárgula de Shariman, e soube entre os demais peregrinos, que havia alguém que possuía tal unha.


E ali estava ele diante da taverna de Vissek em busca de uma maldita ladra errante.


O mago teve sorte naquele início de noite. Por entre a fumaça dos rolos de ervas e dos assados, pode visualisar uma mulher exuberante, sentada sobre uma mesa, cercada de homens que bebiam não só de suas canecas, mas também das histórias contadas pela jovem de longos cabelos negros e olhos cor de mel, tão cheios de promessas falsas...


Lythande retirou o capuz e se aproximou da mesa e viu a mulher erguer os olhos por sobre a caneca de hidromel e fitá-lo curiosa.


Era verdadeiramente uma mulher bonita. Mais baixa que o mago, com a pele dourada de sol, tinha longos cabelos negros, que caíam sobre os seios que saltavam para fora do corset verde musgo, cobertos por uma camisa branca que desnudava os ombros... o corset marcava uma cintura fina e revelava os quadris largos, enfim, um corpo de mulher que justificava todos aqueles homens ao seu redor


-Ora se não vejo adentrar um alaúde! Teremos música, ao invés da minha voz!


Os homens ao redor da jovem riram divertidos. Elisah ergueu-se da mesa e rodeou o mago e parando diante desse fitou longamente a estrela azul em sua testa, tão semelhante à lua que carregava em sua própria nuca.


- Bebes comigo Mago?


- Obrigada, mas não vim em busca de vinho...


- Tudo bem, eu também não. Vissek traga hidromel para o Bardo que acaba de chegar!


Elisah apontou para o alaúde com um leve erguer do queixo.


- Toque, distraia minha pobre cabeça, já cansada de entreter esses senhores com minhas ladainhas...


Lythande trouxe o alaúde até o peito e começou a tocar suas cordas; um cheiro de canela que exalava do instrumento fez com que fechasse os olhos e buscasse inspiração e paciência para com a ladra de olhar zombeteiro.


Um leve dedilhar e Lythande sentou-se diante dos pés da ladra, que novamente se sentara sobre o tampo da mesa e pôs-se a cantar:


-"Eis que se ao acaso sorrires
  Torna-te senhora por hoje, do meu carinho
  Dorme comigo ao menos esta madrugada
  Para que mesmo se partires
  Meu viver não seja tão sozinho
  Nem tão triste tua caminhada..."


O mago olhou para a ladra, por trás de uma mecha de cabelos grisalhos e entoou outras baladas cheias de lirismo e sensualidade. Os homens vendo-se preteridos diante das sedutoras canções de Lythande, um a um deixaram a mesa, até que apenas o mago e a ladra ali permaneceram.


- Pronto menestrel, já não precisas mais flertar comigo, todos foram dormir.


Lythande pousou o alaúde no chão, ao seu lado.


- És Elisah, certo?


- Tão certo quanto os dois sóis que brilharão dentro de horas. E tu, sedutor mago da estrela azul, qual o teu nome e o que desejas de mim?


- Não se revela gratuitamente o nome de um mago - Lhitande observou com um sorriso, que a ladra tirou das dobras da saia, algumas moedas e pequenos objetos, e praguejou sobre a pobreza daqueles homens - Meu nome é Lythande e preciso de um favor seu.


Elisah tirou da bota de montaria, um saquinho de veludo, onde guardou tudo.


- Sabe que necessariamente não preciso fazer isso, mas é difícil desfazer-se de velhos hábitos...Bom, mas em quê essa ladra pode auxiliar-te, mago Lythande?


- Preciso de uma unha do Gárgula de Shariman e sei que você a tem.


Elisah, sorveu o hidromel de sua caneca e num gesto rápido e suave, trocou-a pela caneca cheia de Lythande.


- E o preço, pelo jeito, é à minha escolha.


- Desde que seja justo.


Elisah limpou um filete de hidromel que escorria pelo seu queixo com as costas da mão e estalou a língua diante do prazer de saborear sua bebida em paz.


-É simples, mago da estrela azul. É tempo de colheita, e as florestas estão cheias de saqueadores e outros bandidos vis. Sozinha, eu atravessaria tranquila em poucos dias; tenho um bom cavalo e não seria a primeira vez; mas trago comigo um... um garoto e não gostaria de vê-lo em dificuldades, uma vez que terá que viajar à pé. Vens conosco pela unha que desejas?


- Por que não o leva no cavalo?


- Porque nossas mochilas não sabem voar e não quero matar meu cavalo.


Lythande se aborreceu, mulher egoísta, mais preocupada com um cavalo do que com o tal garoto. Aquela viagem o atrasaria em alguns dias, pensou em negociar, mas o olhar perturbador e ao mesmo tempo calmo da ladra, davam a entender que ela não recuaria em seu pedido e depois, acompanhá-la seria mais fácil do que encontrar e destruir outro gárgula dragão. Sentindo o cheiro suave do suor de Elisah, mesclado com especiarias, Lythande desviou o olhar resignado.


- Está bem Elisah.


Ela sorriu e espreguiçou encantadoramente.


- Bem, então eu me retiro, preciso dormir. Tens onde passar a noite, menestrel? Posso lhe pagar um quarto aqui.


Lythande tentou recusar, mas antes viu a jovem gesticular para o taverneiro.


- Vissek, prepare o quarto ao lado do meu, para que o mago possa descansar. Boa noite menestrel, que a Deusa lhe dê bons sonhos.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Lithande, o mago peregrino

Quando li Lhytande da autora Marion Zimmer Bradley, soube que ela havia dado permissão a quem quisesse escrever usando o personagem Lhytande, que o fizesse, desde que obviamente, respeitasse o personagem.

Como eu estava criando minha primeira personagem de AD&D, Elisah, me inspirei no universo de Marion (As Brumas de Avalon e Lhytande) para compor a ladra que aqui apresento...foi o único prelúdio de AD&D que escrevi, os demais, eu simplesmente descrevi.

Então, antes que me acusem de cópia, plágio ou coisas do gênero, já aviso que me inspirei sim no universo medieval de Marion, isso a uns dez anos atrás mais ou menos...Hoje em dia, talvez escrevesse diferente, mas preferi manter da forma como foi feita.

Elisah já foi apresentada a vocês; agora vou contar como ela conheceu o Mago Peregrino.

Elisah a Ladra - A moça e ladra (Cap. 03)

As coisas começaram a ficar difíceis quando completei treze anos. Despertei com as saias sujas de sangue e comecei a chorar assustada com aquilo, achando que fosse morrer. Logo chamaram minha mãe e ela pacientemente me explicou que agora, eu já era uma mulher.


Chorei mais ainda.


Logo vieram os preparativos para o solstício de verão e eu fazia parte desses preparativos. Como já tivesse sangrado, já estava pronta para os filhos que glorificam A Deusa Nirath. Fui tatuada com um quarto crescente na nuca, lavada e perfumada e vestida com uma túnica de linho fino, que quase nada cobria. Haveriam festejos na cidade e juntamente com outras virgens eu seria entregue aos vencedores dos torneios...


Obviamente eu não estava nada feliz com essa pespectiva; é claro que eu queria dar filhos à Deusa, mas do homem que eu escolhesse, da forma que eu achasse melhor.


- Mãe, por que eu tenho que ir?


- Porque você já é uma mulher e precisa servir a Nirath. Filha, quem sabe o homem que a tomará não se agrade de ti e a queira como esposa?


- E me prostituir pelo resto da vida com um único homem a quem não sei se amarei? Isto é tão vil quanto a vida que levas!


- Vil é roubar! Pensas que não sei, pequena ladra? Eu ao menos vivo do que é meu.


- És mil vezes mais ladra que eu, minha mãe! Eu roubo pequenas coisas, fáceis de serem reconquistadas, dinheiro, anéis, tecidos, tudo isso eles podem conseguir. Tu minha mãe, não rouba apenas o carinho e as moedas que talvez façam falta aos filhos desses homens. Tu roubas o que é das esposas deles, mais do que isso, rouba delas o viço e a alegria, porque ao verem o leito vazio, sabendo onde estão seus maridos, elas se entristecem, se tornam feias e velhas. Tu és mais ladra do que eu! E eu não quero um homem que não conheço rebolando entre meus quadris, invadindo meu templo por dinheiro ou por obrigação!


Levei um sonoro tapa de minha mãe e fui levada ao local dos festejos.


Furiosa, aguardava no interior de uma tenda de campanha por minha triste sorte, quando ouvi a doce voz de Wendel a me chamar:


- Elisah! Elisah querida, venha rápido.


Me ergui do leito e fui até o canto da tenda de onde vinha a voz abençoada de meu amigo, que, arrancando uma das estacas, ergueu a lona e me puxou para fora.


- Sei que não queres que seja dessa forma, menina Elisah. Queres fugir?


- Mais que tudo no mundo, Bardo.


Ele puxou uma pequena mochila, o arco e a aljava de flechas.


- Aí estão uma muda de roupas, seu pequeno tesouro, algumas frutas secas e um punhal. Corra até o nosso local e me espere lá. Não irei agora para que não desconfiem de mim. Agora vá.


Corri como nunca, não para o local combinado, mas para a estrebaria onde costumava pegar o cavalo para cavalgar. A casa estava deserta, todos estavam no festival, e tanto os cavalos quantos os cães da casa me conheciam, não tive problemas em roubar o cavalo uma última vez.


Horas depois, Wendel, me encontrou no alto de uma árvore.


- E então? - perguntei


Ele riu gostosamente


- Estão furiosos, sabes que sois bela e com o tempo serás linda. Mas o vinho e as outras virgens os distraíram e pude vir em segurança. Mas temos que partir e tu não podes seguir assim pintada para os festejos. Iremos ao rio para que você se lave.


- Para onde iremos?


- Para a casa de uma amiga.


E assim foi feito. Passei cinco anos com Svirna, uma elfa linda e delicada, que me ensinou a viver na floresta e me deu as lâminas envenenadas que mantenho amarradas às coxas. Uma me proteje da outra e ambas me protegem daqueles que tiveram a infeliz idéia de me violentar.


Não sei quem deitou as sementes no ventre de minha mãe para que eu nascesse; mas sei que meu pai, foi Wendel. Com o tempo,suas visitas foram escasseando, até que um dia ele não veio mais... E esse foi o sinal de que nada mais havia para fazer na floresta de Svirna.


Iniciei meu caminho só, mercenária errante, aos dezoito anos, sem medo de lançar uma flecha ou sacar meu punhal, a vida dos homens que me enfrentam nada vale.


Hoje tenho vinte e um solstícios e acabei de deixar o grupo de mercenários com o qual prestei serviços a um rei. Durante dois meses eles foram meus irmãos, lutamos uns pelos outros e contra o adversário comum. Fomos bem pagos e cada um tomou seu caminho.


Lembrar de tudo isso, me faz pensar que uma caneca de hidromel cairia bem agora... Tenho muito ainda por viver e isso me dá sede.



Shinny - Cap. 02

Passam por mim gestos e fatos
Como eram seus cabelos o seu rosto?
Cada uma de suas feições?
                                      (Nelson Rodrigues - Valsa nº6)

Eu tinha uns dez anos, quando mamãe ficou doente, com uma tal de anorexia. Morreu magrinha, os cabelos vermelhos esparramados no travesseiro, muito branquinha...Papai bebeu e chorou muito, acho que ele sofreu com a morte de mamãe.

Pena que foi por pouco tempo.

Um vez, acordei no meio da noite e fui até a cozinha beber água ou algo assim, dessas coisas que se faz quando não se está dormindo na madrugada e vi uma cena horrível. Doty deitada sobre a mesa, o vestido rasgado, chorando em seu silêncio, papai entre suas pernas fazendo movimentos bruscos, segurando os pulsos finos de Doty enquanto fazia barulhos estranhos. Em silêncio fui até o escritório de papai e chamei a polícia. Deixei alguns saquinhos brancos de papai, inocentemente fáceis de serem encontrados e voltei para meu quarto.

Pouco depois a polícia chegou. Tiros, gritos, Doty me abraçando com o rosto coberto de lágrimas, papai sendo algemado.

Nunca mais vi meu 'Daddy'...Que pena.

Adoraria tê-lo matado

Shinny - Cap. 01

My child arrived just the other day
Came to the world in the usual way

                                                  (  Ugly Kid Joe - "Cat's in the Cradle")


-Quem é essa garota?

"Boa pergunta cara, pensei"

- Não faço a menor idéia.

"Sei que fui criança, a muito tempo atrás. Mamãe era modelo, linda, alta, sempre distante, ausente...

-Mamãe, quer brincar comigo?

-Não docinho, mamãe está com uma enxaqueca terrível!

-Mas mamãe...

-Por favor filhinha, vá brincar no seu quarto.

Papai não; papai ficava o dia todo em casa, era bonito, másculo, parecia-se com o Marlon Brando ainda jovem. Costumava sentar-me em seus joelhos e cantar para mim enquanto contava dinheiro ou ajeitava seus saquinhos brancos na gaveta da escrivaninha de mogno. Frequentemente surgia alguém que entregava dinheiro ao meu pai, e levava um ou mais daqueles saquinhos brancos. Mas isso eu descobri sem que ele soubesse, porque sempre que essas pessoas chegavam, meu pai me mandava ir brincar com Doty.

Doty era a minha babá. Era baixinha, magrinha, de longos cabelos negros, era muda, mas ouvia muito e muito bem. Ensinou-me a linguagem de sinais pela qual nós conversávamos, mas sempre que queria dizer algo importante, soletrava com a ponta dos dedos em minha mão."

-Ela é uma das nossas?

-Não sei...sei que ela é da família porque a vi caçar.

-Bom Nosferatu ela não é

-Com certeza. De que clã será esta garota?

"Outra boa pergunta.

Dentre as muitas pessoas que iam até a casa de meus pais, comprar o tal pozinho branco, havia um rapaz que sempre vinha à noite. Era lindo e jovem e anos mais tarde poderia até compará-lo com o vocalista do Doors, Jim Morrison; seu nome, era Willian.Quando Willian chegava, sempre chamava por mim.

-Princes, came on!

Eu corria e me sentava em seu colo. Ele então me dava um doce e acariciava meus cabelos, apoiando minha cabeça em seu peito. Conversava comigo, e quando eu estava triste, escrevia em sua mão.

Branco. Volta e meia surgem esses espaços em branco na minha memória.

Um dia, quando eu já era maiorzinha, Doty, escreveu em minha mão que papai era traficante.



sábado, 23 de janeiro de 2010

Elisah a Ladra - Wendel, o Bardo (Cap.2)

Wendel era um jovem coxo de uma perna mais curta que a outra, tinha uma cicatriz q lhe cortava os lábios, mas ostentava uma cabeleira negra em cachos pesados e uma voz tão intensa e melodiosa que o tornavam o mais belo dos homens.

Ele amava minha mãe e devotava-me imenso carinho, mas não tinha como sustentar-nos, então procurava sempre que podia, trocar suas canções por uma noite com ela, mesmo que fosse só para que outros homens não a tocassem; mas amor não põe comida à mesa e ele precisava sobreviver.

Foi Wendel quem cometeu a heresia de ensinar-me a ler e escrever, também a tocar o alaúde, a cantar e apesar de ser coxo, ensinou-me a andar em silêncio.

E andando em silêncio, aprendi a roubar.

Eu odiava aqueles homens e já que eles podiam roubar a dignidade de minha mãe e de tantas outras mulheres, não havia nada de errado em eu roubar algumas de suas moedas e pertences. Costurei bolsos no forro das minhas saias e roubava pelas vielas estreitas do mercado, onde todos se esbarravam tanto, que era fácil demais enfiar a mão em seus bolsos, soltar os cordões de suas bolsas...

E era fácil para uma criança, sumir no meio da multidão.

Eu na minha inocência de menina, achava que conseguiria juntar um tesouro para tirar minha mãe daquele lugar.

Hoje eu sei, que se realmente ela quisesse, teria corrido o risco de passar fome ao lado de Wendel, e com certeza teríamos sobrevivido.

Wendel me prestou ainda um outro grande favor; certo dia, ele me encontrou a atirar pedras numa árvore para colher os frutos.

- Assim é difícil Elisah. Mas você tem boa pontaria.

Ele me abraçou e pegando uma pedra, derrubou um fruto maduro.

-Amanhã lhe trarei um presente, menina Elisah.

O presente era um arco e uma bolsa com flechas e Wendel me ensinou o arqueirismo.

Elisah, a Ladra - os primeiros passos (Cap.01)

Na minha infância havia as noites no porão. Junto ao frio, vinham os gritos, risos e gemidos de homens e mulheres sobre minha cabeça.Vinham também os sons da violência e o choro das mulheres, totalmente entregues à fragilidade de seu sexo.


Eu e outras crianças dormíamos no porão do prostíbulo onde minha mãe e outras tantas mulheres  ganhavam o pão e se destruíam. Quando abriam o portal, já era dia e nossa tarefa era ajudar duas velhas a limpar tudo, enquanto as meretrizes dormiam. Mamãe, num sacrifício extremo, sempre vinha me dar um beijo de bom dia. Depois de tudo limpo, saíamos para brincar, até o cair do primeiro sol, quando éramos banhados e trancados no porão após o jantar.


Costumavam dizer que eu nascera usando saias por engano; vivia em cima das árvores, ou montada a cavalo, sem que o dono soubesse onde seu animal haveria de estar. Mas eu sempre devolvia o cavalo, onde esconderia um bicho daquele tamanho?


Mas havia algo de diferente em minha vida.
Havia um bardo.